Existindo em um mundo inexistente
Não venta lá fora, mas
aqui dentro já saiu tudo do lugar. Sabe quando a gente volta de viagem e encontra
tudo revirado de quando estávamos fazendo as malas? Daí a mala foi enchendo e
não coube tudo, então você deixa ali mesmo. Voltar de viagem é como acordar de
um sonho e se perguntar "onde estou?" nem que seja por alguns
segundos.
Hoje eu me pergunto onde
estou, mas não dura poucos segundos. Dura horas. Dias. Semanas. E ainda não tenho
resposta. Olho para fora, através do vidro da porta, e me pergunto quando
foi que começou e ninguém percebeu. O desamor. A desatenção. A desilusão. O
desafeto. A desconsideração.
A
De
su
ma
ni
da
de.
Hoje o mundo inteiro fala
e vive uma quarentena, mas, para mim, não está diferente do que a gente já
vinha fazendo por debaixo dos panos. Nós vivíamos isolados uns dos outros,
sempre com tanto peso nas costas que ficou impossível enxergar o peso dos
outros. Ninguém quer carregar mais peso, ninguém quer o peso de
ninguém.
E no ar parece até haver
toxinas que deprimem, que desaceleram, que descumprem as leis básicas da
cidadania humana..., mas só hoje é que alguém percebeu. E ainda há os
que não fazem nada. Ainda há os mesmos que antes não viram e que ainda não
querem ver.
O mais certo é que
estejam fingindo não ver.
Sabe, tô cansada de
existir em um mundo inexistente. Inexistente do mínimo possível para ser chamado
de gente: empatia, amor, respeito, humanidade. Se meu telhado é de vidro
e eu não quero que quebre, jamais poderei jogar pedra no dos outros, isso é uma
regra que nossas mães sempre tentaram ensinar.
Mas muitos parecem não
ter aprendido.
Eu não sei mais o que é
existir quando há um mundo inteiro lá fora desmoronando como peças de um
quebra-cabeça que ninguém teve a coragem de consertar quando ainda havia tempo.
Hoje o tempo corre... Tanto que não há relógio que possa mensurar
quanto tempo ainda temos.
No entanto, com toda
minha sinceridade, desejo que ainda possamos virar o jogo. E, além de acabar
com o que está ameaçando acabar com o mundo inteiro, que possamos acabar com
o que a gente se tornou por esquecer o que é ser gente.
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