Não desejo mais te desejar tanto

by - agosto 10, 2015




Às vezes te sinto tocar, seu cheiro se acomodar em minhas almofadas prediletas e seu carisma se instalar no corredor da casa que já se encontra fria. Às vezes te vejo sentado na beirada da cama, ainda de toalha, após aquele baita banho quente, repetindo mais uma vez o quanto é feliz por estar ao meu lado, ao invés de escolher logo qual camisa vestir. Às vezes te vejo abrir a porta da sala e sussurrar: cheguei. Franzindo a testa por não me encontrar a sua espera. Sei lá, às vezes até te ouço falar. Seu suspiro após comer morango e nozes como se essa fosse a melhor combinação do mundo. É que, às vezes, encontro você pelos amassados do lençol sujo do seu suor forte ainda.
Às vezes sinto o cheiro do seu pão com queijo, do seu Nescau às duas da manhã e churrasco em um sábado qualquer. Sinto fome da sua pegada leve, da sua frisada em mim e olhada que desconforta. Vejo sua sombra no boxe do banheiro e o nublado do tempo me faz lembrar seu sorriso por sentir o ar fresco. Mas é que, às vezes, fica difícil suportar aos dias sem escutar sua desafinação na tentativa de me cantar uma música. Sem ouvir suas dezenas de batidas na porta. Sem te ouvir dizer pela milésima vez que esqueceu a toalha.
Muitas das vezes procuro por você na madrugada fria, sinto falta do seu afago, do seu abraço sufocador. Sinto falta da sua mania besta de desligar a luz antes de eu deitar. E até mesmo das suas meias jogadas ao chão do quarto. É que, às vezes, eu preciso de você, mas não posso me deixar levar por suas carícias, por suas juras e olhares desafiadores. Eu preciso não precisar. Eu preciso não estar sempre disponível para sua voz rouca no telefone às cinco da manhã. Eu preciso tentar viver sem que seus passos estejam colados nos meus, porque, nós dois sabemos que já não mais estão.
E talvez eu queira apenas sentir sua falta, sem direito a recaídas ou algo assim. Às vezes eu penso em tocar sua campainha, mas sei que sairei correndo feito adolescente em menos de dois segundos. Mas é que, na maioria das vezes, eu estou aqui do lado de fora só esperando que você me perceba aí da sua janela grande. E ao mesmo tempo eu torço para que você nunca me veja passar, nunca me veja parar e relembrar nós dois, ou que queira fugir em direção aos meus passos tortos. Porque, no fundo, eu não desejo mais te desejar tanto, só que devagarzinho vou entendendo o que é não estar mais a sua procura.
Só não chega de mansinho mais. Não vem encostando com esse seu cheiro enlouquecedor. Não me diz palavras bonitas e, por favor, não sorria. Porque seria uma combinação perfeita pra me fazer esquecer que ando tentando não lembrar. 
Sâmela Faria

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